Origem da plavra Caipira

Baseado na Grande Reportagem “Os Rumos da Música Caipira no Vale do Paraíba”, de Anderson Borba Ciola e Fábio Cecílio Alba, a origem da palavra caipira ainda é motivo de controvérsias. Segundo o Dicionário do Folclore Brasileiro, de Luiz Câmara Cascudo, a palavra significa “homem ou mulher que não mora em povoação, que não tem instrução ou trato social, que não sabe vestir-se ou apresentar-se em público. Habitante do interior, tímido e desajeitado...”. Robert W. Shirley, em seu livro “O fim de uma tradição”, critica a posição de Câmara Cascudo, dizendo que: “Esta definição em si mesma, revela a extensão da grande lacuna social entre os escritores urbanos e os camponeses, pois, de fato, o caipira tem uma cultura distintiva e elaborada, rica em seus próprios valores, organizações e tradições”. Já no Dicionário Aurélio é encontrada a seguinte definição: “Habitante do campo ou da roça, particularmente os de pouca instrução e de convívio e modos rústicos”. Cornélio Pires, jornalista e violeiro, em seu livro “Conversas ao pé do fogo” define a palavra caipira da seguinte forma: “Por mais que rebusque o étimo de caipira, nada tenho deduzido com firmeza. Caipira seria o aldeão; neste caso encontramos o tupi-guarani capiâbiguâara. Caipirismo é acanhamento, gesto de ocultar o rosto, neste caso temos a raiz ‘caí’, que quer dizer gesto de macaco ocultando o rosto. Capipiara, que quer dizer o que é do mato. Capiã, de dentro do mato, faz lembrar o capiau mineiro. Caapiára quer dizer lavrador e o caipira é sempre lavrador. Creio ser este último o mais aceitável, pois caipira quer dizer roceiro, isto é, lavrador...”.

22.2.11

A Origem Caipira////\\\\ e links

designam coisas a que vive alheio, ou idéia abstratas que não atinge”.15
Sobre este isolamento, Monteiro Lobato, em “Urupês”, faz um comentário
depreciativo, mas que ilustra o modo de vida destes indivíduos, ou
deste grupo.
O sentimento de pátria lhe é desconhecido. Não tem sequer a
noção do país em que vive. Sabe que o mundo é grande, que
há sempre terras para diante, que muito longe está a corte com
os graúdos e mais distante ainda a Bahia, donde vêm baianos
pernósticos e cocos.16
No vocabulário levantado por Amadeu, encontramos pouquíssimos
termos ou expressões relacionados a hábitos ou bens urbanos: cabeça seco,
que significa soldado; cambra e câmera (variantes de câmara, referindo-
!' LOBATO, Monteiro. Urupês, p. "().
384
se a Câmara Municipal); inleição; praça; praceano (próprio da praça, do
povoado, ou que vive na praça); surjão (cirurgião – há a forma histórica
‘sururgião’); loja (casa comercial onde se vendem fazendas a retalho;
também se diz loja de armarinho, loja de ferragem).
Segundo Amadeu, “Dos vocábulos estrangeiros modernamente
introduzidos na língua e que são de uso corrente no falar das pessoas
mais ou menos cultas, ele [o caipira] só tem aceito alguns, poucos, relativos
a objetos de uso comum, produtos de artes domésticas, etc.: paletó
(que desterrou por completo o vernáculo casaco), croché, cachiné, revórve
etc.”17 Essas três palavras têm registro de entrada na língua no século
XIX, com exceção de “cachiné”, de que não encontrei registro, nem no
próprio livro de Amadeu.
Por outro lado, abundam termos relacionados à lida com animais
domésticos, especialmente bovinos e eqüinos, seja a característica do animal,
o seu manejo ou as atividades e objetos que envolvem a lida com os
mesmos. Os nomes de elementos da fauna (não domesticada) e da flora
(não cultivada) também são bastante consideráveis, o que é facilmente
explicado pela variedade de espécies.
Para espingarda há dezenas de palavras conexas, descrevendo os diferentes
tipos desta arma ou uma de suas peças: lazarina (espingarda de
cano comprido), porva, pica-pau, reúna (carabina de soldado), trabuco,
trochado, ascançadera (feminino de alcançador), cartuche (variante de cartucho),
cravina (variante de carabina), cravinote. Essa profusão de termos
deixa clara a presença desta arma entre eles. São também em grande
número os termos relacionados a animais de sela e a animais de tração
(bois), a objetos de uso doméstico, de trabalho na roça, de caça, de pesca.
Como as práticas ligadas a esses objetos ou os próprios objetos tendem a
desaparecer, o termo que os designa vai caindo em desuso: “As palavras
se emprestam, se esquecem, se perdem, se renovam”.18
!) AMARAL, Amadeu. O dialeto caipira, p. '$.
!( DARMESTETER, A. La vie des mots étudiés dans leurs significations apud DUARTE, Paulo. Dialeto caipira e língua brasileira.
In: AMARAL, Amadeu. O dialeto caipira, p. !".
Entre os termos relacionados a comportamento do ser humano, a
maioria realça aspectos de caráter negativo e, freqüentemente, jocosos.
Predominam as ações e os qualificativos ligados a fraqueza, a falta de
dinheiro, a brigas, a falta de esperteza, a punição: asperejá(r) (usar de
linguagem e modos ásperos com alguém), atenta(r) (irritar), azucrina(r)
(importunar), azula(r) [fugir; sentido irônico ou burlesco], banza(r) (pensar
aparvalhadamente em qualquer caso impressionante), bobiá(r) (enganar,
fazer alguém de bobo), bocage(m) (uso de palavras e expressões
indecentes), cainhá(r) (fazer mesquinharias), cavaquear (irritar), cherata
(metediço, intruso), cinismo (tédio, monotonia), cinza (na expressão sair
cinza = haver conflito, briga), cismar, costear (fazer sofrer provocando
inveja), desabotinado (meio doido, espalhafatoso), miqueado (que perdeu
ou gastou todo o dinheiro que possuía), lerdiá(r) (apatetar-se), etc., etc.
Os termos que denotam comportamento ou qualidade positiva realçam
a bravura, a descontração: escorar (aturar, fazer frente a [um trabalho
pesado, uma agressão, uma prova de força ou de valentia]), destorcido
ou distrocido (lépido, decidido, pronto, destabocado ou sacudido) ou o
envolvimento amoroso. Substantivos abstratos não ligados a comportamento
ou a uma qualidade humana também são raros (casião, cisma,
causo, inzempro, átimo).
O texto de Amadeu Amaral, especialmente no capítulo do vocabulário,
apesar de construído segundo critérios formalizados e explicitados
com clareza, traz muitos comentários de cunho enciclopédico, comuns
em dicionários temáticos, mas não em dicionários de língua. Observe-se
que, comparado com O linguajar carioca, de Antenor Nascentes, o livro
de Amadeu é mais rico em ilustrações e em comentários que referem
também aspectos da cultura do povo cujo dialeto descreve. No verbete
aguaxado, por exemplo, Amadeu ocupa duas colunas para tecer comentários
não só acerca da etimologia, mas também sobre a interpretação
dada ao seu sentido pelos roceiros.
Aguaxado significa “entorpecido pela longa inatividade e pela gordura
(o animal de sela)”, sentido encontrado ainda hoje também no Sul
do Brasil e em Goiás. Amadeu sugere a entrada do termo no português
pelo espanhol aguajar/aguachar (“úlcera ou tumor aquoso que se forma
nos cascos dos cavalos ou das bestas”) e à de ajuaga ( “tumor nos cascos
das bestas”). Como os efeitos do tumor e da gordura são semelhantes
(lentidão da marcha do animal), uma palavra teria sido tomada pela
outra. A explicação de Amadeu Amaral para essa mudança é que se
alonga e desvia, resultando num texto bom de ler, como se vê por alguns
trechos:
Talvez tenha influído nisso a palavra aguado. Aguado diz-se do
animal atacado de certa doença que lhe tolhe os movimentos: por
aqui se prenderá a alguaxa, tumor do casco. Essa doença caracteriza-
se por uma abundância de líquido seroso, que os nossos
roceiros dizem existir no pescoço do animal e que se faz vazar, geralmente,
por meio de sangria: por aqui se relaciona com água. A
doença é atribuída pelo povo, ao menos em alguns casos, a desejo
insatisfeito de comer: ainda uma influência de água, pois o apetite
faz vir água à boca. Também se diz de uma criança que ela aguou
quando ficou triste e descaída por ver outra criança mamar, não
podendo imitá-la, ou por lhe apetecer coisa que não lhe podia ser
dada. [...] Tratando-se de animal aguado, era forçoso que houvesse
água, e foram descobri-la no pescoço, não já nos cascos, como
seria mais razoável. Existe essa água? Os roceiros afirmarão que
sim, sem admitir dúvida, mas há quem duvide. Eis o que diz,
por exemplo, o dr. E. Krug: “Deve ser considerado superstição o
tratamento de animais aguados por intermédio de uma sangria,
que se executa no pescoço. Esta superstição é muito espalhada no
nosso estado e mesmo pessoas que se devia presumir possuírem
maiores conhecimentos na zootecnia usam-na. O estar aguado do
animal nada mais é do que um crescimento irregular dos cascos,
geralmente devido a um excesso de marcha, etc., e isto, certamente,
não se pode curar sangrando um animal. Diz-se que, depois
de uma sangria, quando esta é feita de um só lado, o animal fica
sempre manco; para se evitar este inconveniente sangra-se o animal
dos dois lados. Não posso dizer se isto é também superstição
ou fato verificado praticamente.19
!% AMARAL, Amadeu. O dialeto caipira, p. (&-('.
387
Comentários mais alongados são freqüentes em verbetes ligados às
crendices, festas ou hábitos populares, como cuca, currupira, folia, judas,
saci entre outros. Vejamos, apenas para ilustrar, esta outra observação,
no verbete cumbuca.
CUMBUCA, s. f. – cabaça esvaziada, que serve a vários fins, entre
os quais o de armadilha para apanhar macacos. Neste caso, é
um vaso grande, de boca muito pequena, onde se põe milho, e
que se coloca em lugar conveniente, no mato. O macaco mete a
mão pelo orifício e agarra um punhado de grãos, mas não pode
retirar a mão cheia, e debate-se preso à cumbuca, sem se lembrar
de largar o milho. Isto se conta geralmente, mas não conhecemos
ninguém que o houvesse testemunhado em pessoa. Cp. o
provérbio – ‘macaco velho não mete a mão em cumbuca’.20
A maioria das observações é, no entanto, acerca de origem dos termos,
algumas categóricas (e nem sempre corroboradas pelas etimologias
elaboradas posteriormente por outros estudiosos, como Antenor Nascentes,
José Pedro Machado, Antônio Geraldo da Cunha ou Antônio
Houaiss), outras apontadas como discutíveis. Para construir esses comentários
etimológicos, lança mão de estudos feitos por dicionaristas, ou faz
comparações com outras línguas, especialmente o tupi ou o espanhol.
A grande maioria dos termos e acepções coletados por Amadeu
Amaral é registrada pelos dicionários contemporâneos como brasileirismos.
Seria um sinal de que o dialeto caipira não ficou tão “acantoado”
assim? Que os termos chegaram em diversas regiões do Brasil? Que foram
levados por bandeirantes e mineradores, ou que chegaram a São
Paulo, vindos de outra região? Um grande número de vocábulos também
caipiras é registrado por outros dicionários de língua portuguesa
como pertencente apenas à região Sul do Brasil, especialmente aqueles
relacionados a eqüinos. Talvez os termos deste campo semântico tenham
sido importados do Sul, em vista da raridade da lida com cavalos no início
do povoamento de São Paulo. Como disse anteriormente, o contato
"* Ibid., p. !"$.
388
comercial entre os paulistas e os gaúchos foi intenso, o que resulta numa
natural incorporação de termos.
Amadeu esclarece que incluiu no vocabulário somente termos ou
definições ouvidos dos roceiros. “Deixamos de lado, em regra geral,
aqueles que não temos visto usados senão em escritos literários, e por
mais confiança que os autores destes nos merecessem.”21 As notas e observações
em alguns verbetes também nos levam a deduzir que Amadeu
só incluiu no vocabulário termos colhidos na fala de mais de um informante.
Em um caso ou outro, registra usos idiossincráticos, mas faz a
devida ressalva, como esta:
QUARTA-FÊRA, q. — [que quarta-fera] tonto, atoleimado:
“Também, o que é que faz um pobre dum quarta-feira, no meio
dos que tinham juízo?” (V.S.) // Acreditamos que seja antes um
tipo de gíria local, sempre instável e caprichosa, do que aquisição
definitiva da linguagem oral do povo.22
Ou esta:
AFITO, s.m. – mau olhado. /Apesar de nunca termos ouvido este
voc., e só o havermos encontrado num escrito [“A Superst. Paulistana,
eng. E. Krug], resolvemos registá-lo, por ser dos mais
curiosos.23
A partir daí tece comentários sobre a etimologia do verbete, cruzando-
o com o sentido “indigestão, diarréia”.
A pesquisa de Amaral revela um dialeto com dinâmica própria, com
traços peculiares na apropriação de termos e na extensão de sentidos, seja
pela vida que há ao redor dos falantes, seja pela palavra que lhes chega
aos ouvidos (quanto menos contato, mais conservador). Quanto maior o
= Valdomiro Silveira.
389
isolamento, menos se fala. Daí, o grande número de arcaísmos, atestados
pelas abonações coletadas em textos quinhentistas.
Não sabemos exatamente como foi captada a fala dos “indivíduos
desprevenidos”, como Amadeu nomeou a fala espontânea, mas esta leitura
demonstra a seriedade e a perspicácia com que ele ouviu esta fala.
A seleção vocabular do caipira não está completamente desvendada
no trabalho de Amadeu, pois o registro é das palavras que fugiram ao
comum da fala padrão (portuguesa), das palavras que fossem uma marca
do dialeto. No mais, os significados seriam os mesmos. Mas, como
sabemos, seu propósito não era colher o milho, o arroz ou outro cereal,
mas sim a quirera.
Quirera é o resíduo “de milho, arroz ou outro cereal, que fica na
peneira; é a mistura de cascas quebradas e fragmentos de grãos”, e, para
quem sabe olhar, é o desconhecido, o que pode surpreender.
390
Referências bibliográficas
AMARAL, Amadeu. O dialeto caipira: gramática, vocabulário. 3. ed. Prefácio de
Paulo Duarte. São Paulo: Hucitec em co-edição com a Secretaria de Cultura,
Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, 1976.
CARMO, Laura Aparecida Ferreira do. “A tradição ainda canta”: a poesia da canção
caipira. Rio de Janeiro, 1998. Dissertação (mestrado em Literatura Brasileira)
– Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
CASTRO, Vandersi Sant’Ana. Revisitando Amadeu Amaral. Disponível em: http://
gel.org.br/4publica-estudos-2006/sistema06/715.pdf. Acesso em: 30 out. 2007.
LOBATO, Monteiro. Urupês. In: ______. Urupês. 8. ed. São Paulo: Brasiliense,
1956.
RIBEIRO, Darcy. O Brasil caipira. In.: ______. O povo brasileiro. 7. ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.
RICARDO, Cassiano. Marcha para Oeste: influência da “Bandeira” na formação
social e política do Brasil. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1942.
 
 ___________________________________-
 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Caipira
 
procurar este saite
_________________-
 
Este pdf
http://www.google.com.br/#hl=pt-BR&biw=1345&bih=508&rlz=1R2ADFA_pt-BRBR409&q=linguajar+caipira++de+itu&aq=f&aqi=&aql=&oq=&gs_rfai=&fp=5dc52e02a107a2af
 
________________
 
  A Origem Caipira
de viola e os blues. A guinada para a country music, com a adoção de instrumentos eletrificados e a formação de grandes bandas deu-se a partir do mega-sucesso de Chitãozinho e Xororó, em 1982. A eles, seguiram-se outras duplas de sucesso, cada vez mais direcionadas para o romatismo pop herdado da jovem guarda, como Leandro & Leonardo e Zezé Di Camargo & Luciano.
    Os anos 90 marcaram a convivência de dois segmentos musicais originários dos gêneros rurais: o dos mencionados sertanejos-pop, voltado para grandes mercados internacionais, e o dos novos-caipiras - músicos saídos das universidades, dispostos a retrabalhar a música "raiz". Estes criaram um circuito de gravadoras independentes e apresentações em teatros, entre São Paulo e Belo Horizonte, já se irradiando até o Rio de Janeiro. Os detonadores desse movimento foram Renato Teixeira e Almir Sater. Entre os nomes mais expressivos dessa nova geração de instrumentistas-compositores estão os mineiros Roberto Corrêa, Ivan Vilela, Pereira da Viola e Chico Lobo, e o paulista Miltinho Edilberto. 
A Viola
            A viola é um instrumento bem menor que o violão, com a cintura mais acentuada, e encordoado de maneira diferente. Ela possui dez cordas, agrupadas duas a duas, sendo algumas de aço e outras, revestidas de metal. A disposição das cordas, começando de baixo para cima é: os dois primeiros pares afinados em uníssono; e os demais, afinados em oitavas. Os nomes dados as cordas são de origem portuguesa, existindo, no entanto, muita contradição nas informações prestadas pelos violeiros, ou seja, a mesma corda recebendo vários nomes diferentes. Alguns violeiros concordam em geral com os seguintes nomes: prima e contra Prima ou primas - requinta e contra-requinta ou segundas - turina e contra-turina - toeira e contra-toeira - canotilho e contra-canotilho. Para o terceiro par encontramos ainda o nome verdegal, quando é usada linha de pesca no lugar da corda de aço. As violas, geralmente, são feitas artesanalmente, e o tempo mínimo para se fazer uma viola é de dez dias. 0 conhecido artesão Zé Côco do Riachão, um dos raros "fabricadores" de violas e rabecas, utiliza uma cola feita de banana do mato, também conhecida por sumaré. No tampo, ele usa a madeira emburana de espinho; o braço é feito de cedro; o espelho, cravelhas e ornamentos de caviúna (candeia); e a lateral feita de pinho. Entretanto, na maioria das violas encontradas, a madeira utilizada para o tampo, foi o pinho que, de acordo com os violeiros, é a de melhor sonoridade. 0 violeiro costuma dar à viola, os mais variados nomes, assim temos a viola caipira, a viola cabocla, a viola sertaneja, a viola de pinho, a viola de dez cordas, todas se referindo ao mesmo instrumento. A viola com dez trastes é denominada também de meia-regra, e a com trastes até na boca, de regra-inteira. No litoral paulista, foram encontradas, violas com sete cordas, (dois pares e três singelas), nove cordas (quatro pares e uma singela), e dez cordas (cinco pares), todas mantendo as cinco ordens de cordas. É interessante observar que, numa das afinações da viola de sete cordas, o quinto par foi afinado em intervalo de quinta, e o quarto, em uníssono.
Pesquisa feita por Kilza Stti, no início dos anos sessenta no litoral norte do Estado de São Paulo.
Viola de Cocho
A palavra cocho é empregada pelo homem do campo, referindo-se a uma tora de madeira escavada, formando uma espécie de recipiente. A viola de cocho, encontrada no estado de Mato Grosso, recebe este nome, porque é confeccionada em um tronco de madeira inteiriço, esculpido no formato de uma viola, e escavado na parte que corresponderia à caixa de ressonância. Neste cocho, no formato de viola é afixado um tampo, e em seguida, as partes que caracterizam o instrumento, como o cavalete, o espelho, o rastilho e as cravelhas. 0 seu comprimento é em torno de 70 cm por 25 cm, com 10 cm de largura. Algumas violas possuem um pequeno furo circular no tampo, medindo de 0,5 a 1 cm de diâmetro, outras não apresentam furo. A viola sem furo no tampo é coisa recente, os violeiros antigos a preferem com o furo, pois no dizer de um destes violeiros, "o furo é prá voz ficá mais sorta, sem o furo a zoada fica presa". 0 braço da viola, juntamente com a paieta (cravelha, é bem reduzido, medindo em torno de 25 cm. O cocho é de muita utilidade no campo, e se presta, principalmente, à alimentar os animais domésticos.
A paieta, geralmente, faz um ângulo bem acentuado com o corpo do instrumento, e possui cinco ou seis furos. Este instrumento apresenta sempre cinco ordens de cor das, com as cinco cordas singelas, ou com quatro singelas mais um par. Neste caso, a terceira ordem consistiria de um par de cordas afinado em oitava. Também é encontrada viola com seis furos na paieta, mas com apenas cinco cravelhas. As madeiras utilizadas na sua construção são várias: para o corpo do instrumento as preferidas são, a Ximbuva e o Sarã; para o tampo, Figueira branca, e para as demais peças, o Cedro. A maioria das violas de cocho se armam com cinco cordas singelas, quatro de tripa e uma de aço. Atualmente as cordas de tripa estão sendo substituídas por linhas de pesca, devido a proibição de caça na região. Estas, de acordo com os violeiros, são bem inferiores às de tripa. A corda de aço tem o nome de "canotio", e tem, aproximadamente, o mesmo calibre da quarta corda do violão. Os nomes das cordas são os seguintes: prima, segunda ou contra, do meio ou terceira, canotio e corda de cima. A preparação da tripa, para a confecção das cordas, é muito rudimentar, para explicar o procedimento adotado, transcrevemos, abaixo, os depoimentos de alguns violeiros, quando indagados sobre esse assunto. - "Ah! isto é fácil, o sinhô mata o animá, tira a tripa, e limpa bem por fora, vira ela e limpa bem por dentro, bem limpadinho. 0 sinhô marra um fio dum lado e dôtro e troce bem trucido. Estira o fio duma árvore a otra, põe um pesinho e pronto. Ele vai estirano... estirano, vai secano. Ah! fica que... uma beieza!!!" -- Sr. Gregório José da Silva, 74 anos, cururueiro - Poconé-MT, em 1983. - "Tira toda a tripa do Ouriço e começa a limpá com a unha, tira a carne de cima ficano a pura tripa. Depois vira ela, prá limpá por dentro e sair o limbo. Quando sai o limbo fica bem alvinho!, troce a tripa bem trucida e estira ela. Deixa secá e pronto.
Aqui é muito difícil prá gente ter a corda, no sítio tem muita!" -W- Sr. Edézio Paz Rodrigues, 81 anos, cururueiro - Poconé-MT, em 1 953. ficano a pura tripa. Depois vira ela, prá limpá por dentro e sair o limbo. Quando sai o limbo fica bem alvinho!, troce a tripa bem trucida e estira ela. Deixa secá e pronto. Aqui é muito difícil prá gente ter a corda, no sítio tem muita!" -W- Sr. Edézio Paz Rodrigues, 81 anos, cururueiro - Poconé-MT, em 1 953.
- "A tripa é o seguinte: Ocê pega a tripa e tira todo o ligume, toda massa, depois de tirar toda massa, tem que rapá a carne que tem por dentro. Por cima é uma pele muita fina... vira do avesso e vai rapano com muita ciência, quase não é passado unha, só com a força do dedo. Ocê faz uma cumbuquinha de foiha, coloca a tripa dentro e urina dentro, deixando passá uma meia hora, uma hora, na urina, prá curtí, prá dá mais resistência. Então agora vai levá num lugar de ispichá e, de acordo, com a grossura que ocê quer a corda, ocê vai botá peso, uma pedrinha marrada num fio bem no meio dele. Se quer que ela fica mais grossa, tem que botá peso menos, quer que ela fique mais fina, tem que botá peso maió... tem que torcê que fica turcidinha. 0 Ouriço dá doze cabeça de corda, dá prá encordoá uma viola, inda sobra..." - Sr. Manoel Severino de Moraes, 54 anos, artesão de viola de cocho e cururueiro - Cuiabá-MT, em 1 981. São vários os animais, cujas tripas são empregadas na confecção de cordas, os preferidos são: 0 Ouriço-Cacheiro (Porco-Espinhol, o Bugil (espécie de macaco, a Irara, o Macaco-Prego e Porca magra. A tripa de gato, apesar de dar uma boa corda, não é usada, porque, numa roda de cururu, se alguma viola estiver encordoada com cordas de tripa de gato, em pouco tempo começa a surgir brigas entre os violeiros. A tripa de gado não é usada porque é pouco resistente, "não guenta um toque". A do Macaco-Prego é muito usada, mas somente na época em que ele não está comendo formigas. Os violeiros afirmam que suas tripas ficam cheias de nós, provenientes das picadas destas, quando engolidas vivas. A viola de cocho é um instrumento bem primitivo, o número de pontos, ou trastos, varia entre dois a três. Quando a viola possui três pontos, o intervalo entre eles é de semitom, quando possui dois pontos, o primeiro dá o intervalo de um tom, e o segundo de semitom. Os pontos são feitos de barbante, amarrados bem firmes, e revestidos com cera de abelha, para que prendam melhor na madeira, no dizer do violeiro "prá garrá, prá firmá, senão ele joga... tano seco ele joga". A colagem das partes é feita usando o sumo da batata de sumaré (planta de região úmida), ou, na fala desta, um grude feito da "paca" da piranha, uma pequena tripa, também conhecida por bexiga natatória. A viola de cocho é usada, principalmente, para o cururú e o siriri, funções bem populares em Mato Grosso, mas também é usada para o rasqueado. Ela possui duas afinações básicas, a afinação "canotio solto" e a afinação "canotio preso", sendo muito semelhantes entre si.
Os acordes mais usados são os de Tônica e Dominante com sétima e raramente o de Sub-Dominante. No siriri, onde a Sub-Dominante é mais usada, a afinação empregada é a de "canotio preso", para que esse acorde seja armado com apenas dois dedos. O interessante é que essa mesma armação é muitas vezes usada com a afinação "canotio solto".
          As informações deste capítulo foram colhidas por E. Travasso e o autor, em pesquisa do instituto Nacional do Folclore, FUNARTE, em Mato Grosso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada por contribuir com sua informação